Decisão do STF reforça tendência de funcionamento das instituições brasileiras

Por Bruno Carazza

 

Mais uma derrota do governo Bolsonaro no STF passou praticamente despercebida. No último dia 15/06, o plenário do Supremo decidiu, por unanimidade, conceder liminar para suspender uma portaria do Ministério da Agricultura sobre agrotóxicos.

Defensores de Bolsonaro frequentemente argumentam que os ministros do Supremo não o deixam governar, mas também é verdade que, desde a posse, há uma estratégia do presidente de evitar debates sobre matérias polêmicas no Poder ao qual deveriam ser submetidas: o Legislativo.

Esse jogo de gato e rato funciona basicamente da seguinte maneira:

1º movimento (ação): Para fugir de discussões sobre matérias controversas, o governo edita normas infralegais (como decretos e portarias), em vez de enviar um projeto de lei ao Congresso.

2º movimento (reação): Partidos da oposição ou organizações da sociedade civil entram com ações constitucionais (ADIs, ADPFs, etc.) no Supremo questionando a norma e pedindo sua suspensão.

3º movimento (resultante): O STF concede a liminar suspendendo as novas regras.

Jair Bolsonaro entrega homenagem à Ministra de Estado da Agricultura, Teresa Cristina da Costa Dias, em 2019. Foto: Carolina Antunes/PR

Neste último caso, trata-se da Portaria nº 43/2020, editada pelo secretário de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, que inverte a lógica de liberação de agrotóxicos e outros defensivos usados na produção rural.

A portaria adotava a ideia prevista na Lei da Liberdade Econômica (art. 3º, IX), segundo a qual se o órgão governamental não realizar a análise prévia dos riscos no prazo, considera-se que o pedido feito pela empresa estaria tacitamente aprovado.

A medida foi questionada pela Rede e depois pelo Psol, arguindo que a portaria descumpria preceitos fundamentais da Constituição, como o direito à saúde e o equilíbrio, na ordem econômica, entre a livre iniciativa e a existência digna da população (art. 170). A petição inicial apresentada ao STF pode ser lida aqui.

No julgamento do dia 15/06, o plenário do STF seguiu o voto do relator, Ricardo Lewandowski, que entendeu que “onde existam ameaças de riscos sérios ou irreversíveis não será utilizada a falta de certeza científica total como razão para o adiamento de medidas eficazes”.

E concluiu: “A portaria ministerial (…) feriu direitos consagrados e densificados após séculos de reivindicações sociais com vistas a configurar a dignidade humana como valor supremo da ordem jurídica e principal fundamento da República Federativa do Brasil”.

Apesar da concessão da liminar pelo plenário do STF, o Tribunal voltará a se reunir para julgar o mérito das ações. Mas até lá a Portaria nº 43/2020 ficará sem efeito.

Para acompanhar a tramitação dos processos, clique aqui: portal.stf.jus.br/processos/deta portal.stf.jus.br/processos/deta