Projeto de lei obriga comércio a disponibilizar lupas para clientes

Por Bruno Carazza (www.brunocarazza.com.br/).

 

A deputada federal Edna Henrique (PSDB/PB) propôs no final do ano passado um projeto de lei tornando obrigatória a disponibilização de lupas em mercados, mercearias, farmácias, lojas de departamento e afins (PL njº 6.457/2019).

A proposta é um exemplo quase perfeito de como é feita a maioria das leis no Brasil:

1. Apresenta um diagnóstico de um problema social: “Dados do último censo apontam que 18,8% da população residente no Brasil possuem algum tipo de deficiência visual.”

2. Reveste-se da melhor das intenções para justificar a medida: “pretendemos tornar mais digna a rotina desse grande número de pessoas que, no mercado de consumo, depara-se com obstáculos ao pleno exercício do seu direito à informação”.

3. Apresenta uma solução sem qualquer estudo sobre seus efeitos: “A disponibilização de lupas nos estabelecimentos comerciais consiste em recurso de acessibilidade bastante útil e democrático”.

4. Cria deveres sem qualquer consideração sobre custos e quem arcará com eles: “É obrigatória a disponibilização gratuita de lupas de aumento, para utilização pelos consumidores, nos mercados, mercearias, empórios, farmácias, lojas de conveniência, de departamento” etc.

5. Joga o ônus da regulamentação para o Poder Executivo: “As especificações, a disposição e a quantidade de lupas que devem ser disponibilizadas serão definidas nos termos de regulamentação a ser expedida pelos órgãos federais competentes no âmbito do Poder Executivo.”

6. Para completar o quadro, só faltou instituir uma multa para quem descumprir a lei.

Deputada federal Edna Henrique apresentou projeto que obriga a disponibilização de lupas no comércio. Foto: Michel Jesus/ Câmara dos Deputados

Ninguém discorda que a deficiência visual é um problema que afeta milhões de pessoas no Brasil. A questão é que isso não se resolve com políticas públicas concebidas na base do achismo.

A ilustre deputada por acaso se questionou se há alternativas mais efetivas de combater o problema (como a distribuição de óculos, por exemplo)? E quais serão os custos para se implementar essa política? E quem arcará com eles? Esse tipo de pergunta deveria nortear o pensamento dos parlamentares antes da apresentação de qualquer projeto de lei.

Propostas como a das lupas da Dep. Edna Henrique congestionam os Legislativos em todo o país, gerando desperdício de tempo (elaboração de pareceres, análises de assessores e consultorias, etc) e consequentemente dinheiro público.

E o pior: muitas dessas iniciativas são aprovadas, impondo um ônus excessivo a cidadãos, empresas e ao poder público, que tem que fiscalizar o seu cumprimento.

No Legislativo brasileiro, sobram boas intenções e faltam evidências.