A entrevista do mês aprofunda o tema do poder político e de sua interferência em políticas públicas. Bruno Carazza, professor do Ibmec e da Fundação Dom Cabral, destrinchou as engrenagens do sistema político brasileiro, compilando e cruzando dados sobre doações de campanhas eleitorais, tramitação de projetos de lei, votações e atuação parlamentar. Assim, deu origem ao livro Dinheiro, Eleições e Poder, lançado em 2018, pela Companhia das Letras, onde analisa como os eleitos tendem a retribuir as doações recebidas das grandes empresas.

02.07.21

 

Você considera que hoje, no Brasil, podemos dizer que sofremos com a interferência de setores produtivos sobre a formulação de políticas? Como se daria esta interferência na sua percepção?

Essa interferência sempre aconteceu no Brasil – e é assim também no mundo todo. As decisões que o Estado toma em relação a tributação, regulação, incentivos e políticas públicas têm impacto direto em muitas empresas; logo, tentar interferir nessas escolhas é natural, e faz parte do jogo democrático. O grande problema é que esse processo é muitas vezes conduzido de forma desbalanceada (grandes empresas têm um acesso muito mais fácil a parlamentares, juízes, ministros e Presidente), pouco transparente e, em alguns casos, utiliza métodos ilegais.

Quais setores você observa que têm hoje maior influência sobre a formulação das políticas públicas? 

É difícil estimar quais setores exercem uma influência mais marcante sobre os três Poderes da República, pelas várias formas como ela se manifesta e por não termos instrumentos que conferem maior transparência a essa relação entre autoridades públicas e representantes do setor privado. No Brasil o lobby não é regulamentado, a divulgação de agendas públicas de autoridades ainda é restrita, a tramitação de processos no Congresso e principalmente no âmbito do Executivo muitas vezes ainda é opaca – tudo isso dificulta termos uma visão mais abrangente do processo. Mas acho razoável supor que quanto mais dependente do Estado, maior o interesse das empresas em tentar influenciar a tomada de decisões quanto a políticas públicas.

Como você observa a atuação das indústrias dos setores de alimentos e bebidas hoje sobre a agenda política?

Nos últimos anos tomamos conhecimento de diversos episódios em que grandes empresas do setor de alimentos e bebidas valeram-se de métodos diversos, de volumosas doações de campanhas a partidos e políticos à corrupção pura e simples, passando ainda por um pesado lobby, para obter de governos e do Congresso Nacional uma série de vantagens, como créditos subsidiados em bancos públicos, benefícios tributários (ICMS, Zona Franca de Manaus, etc.) e afrouxamento da regulação sobre agrotóxicos e alimentos ultraprocessados.

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