Fundão turbinou custo das campanhas neste ano

Por Bruno Carazza. Publicado originalmente no jornal Valor Econômico em 19/09/2022.

 

Nos últimos anos nos acostumamos a analisar cada postagem dos políticos no Twitter e no Facebook, assim seus vídeos no YouTube, Instagram e TikTok. Mas não há nada igual à boa e velha reportagem de campo, aquela em que o jornalista segue cada passo do candidato no corpo-a-corpo com o eleitor.

Presidente da Câmara e líder do Centrão, posições que lhe permitem manobrar votações e controlar a distribuição de verbas do orçamento, cada declaração de Arthur Lira (PP-AL) em Brasília repercute no meio político e no mercado.

O repórter Raphael di Cunto, da editoria de Política do Valor, porém, mostrou uma face diferente do todo-poderoso Arthur Lira que estamos habituados a acompanhar pela TV. O jornalista passou uma semana viajando por todo o Estado de Alagoas, cobrindo carreatas, entrevistas a rádios e dezenas de almoços e jantares com prefeitos em apoio à reeleição de Lira.

As matérias de Raphael di Cunto mostram como o político tem usado o fundão eleitoral, os recursos do orçamento secreto e o discurso conservador em busca de uma votação expressiva que lhe garanta o cacife necessário para continuar dando as cartas no Congresso.

Além de mostrar o funcionamento da máquina eleitoral do Centrão, a reportagem também lança luz sobre um aspecto pouco comentado hoje em dia. Em declaração ao repórter, Lira argumenta que as eleições para deputado federal neste ano serão muito mais concorridas do que as de 2018.

Seguindo a pista do cacique do PP captada pelo repórter, mergulhei nos números para descobrir se ele estava falando sério. Na falta de pesquisas confiáveis para deputado federal, uma medida razoável de aproximação é a arrecadação dos candidatos. Num país em que as eleições são tão caras, quem obtém mais dinheiro – do partido ou de grandes doadores – costuma ter uma grande vantagem.

Para se ter uma ideia, nas eleições de 2010, 538 candidatos a deputado federal arrecadaram valores equivalentes a R$ 1 milhão ou mais em dinheiro de hoje, corrigidos pelo IPCA. Desses, 362 se elegeram.

Quatro anos depois, em 2014, os candidatos “milionários” saltaram para 541, sendo que 345 foram bem-sucedidos.

Por fim, na última eleição geral, aqueles que arrecadaram mais de um milhão foram 637, com 341 se sagrando vencedores em 2018.

Neste ano, segundo os dados declarados até a sexta-feira passada (16/09), já temos o recorde de 815 aspirantes a uma cadeira na Câmara dos Deputados com receita superior a um milhão de reais nesta campanha.

Conforme pode ser visto no gráfico, o número de candidatos “milionários” já iguala ou supera o número de vagas em todos os Estados do país.

A explicação para essa inflação de candidatos com acesso a montantes milionários para fazer campanha neste ano está nos R$ 4,9 bilhões do fundo eleitoral, complementados com mais de R$ 1 bilhão de fundo partidário.

Além disso, neste ano não temos mais as coligações nas disputas para a Câmara, o que levou cada um dos 32 partidos a lançarem mais candidatos – e a investir pesado nos membros com maior chance de vitória.

Com os partidos com o caixa cheio, os deputados federais atuais estão sendo agraciados com dotações de R$ 1 milhão a R$ 3,1 milhões, a depender do porte da legenda e de sua fatia no rateio do fundão.

Além dos atuais parlamentares em busca de reeleição, as siglas têm apostado também em ex-governadores e antigos deputados federais, bem como deputados estaduais e vereadores de grandes cidades com bom histórico de voto.

A campanha deste ano é turbinada ainda por doações privadas, que irrigam candidaturas como a de Douglas Belchior (PT-SP, com R$ 635 mil até agora) e Ricardo Salles (PL-SP, R$ 1,4 milhão) – para ficar apenas em dois exemplos, da esquerda à direita.

A contar pelo investimento de partidos e de grandes doadores privados, parece que as eleições deste ano para a Câmara serão mesmo muito concorridas, como captou o valoroso repórter Raphael di Cunto ao acompanhar o poderoso Lira em suas andanças por Alagoas.