Atribuições de combate à lavagem de dinheiro passam para Unidade de Inteligência Financeira do Banco Central

Por Bruno Carazza

 

O presidente Jair Bolsonaro acaba de editar a Medida Provisória nº 893, que transforma o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em Unidade de Inteligência Financeira.

Criado em 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso, com a finalidade de identificar ocorrências suspeitas de lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e financiamento de terrorismo e outras atividades criminosas, até o início deste governo o Coaf se constituiu na unidade de inteligência financeira do Ministério da Fazenda, tendo sido fundamental em inúmeras operações de combate à corrupção, como o Mensalão e a Operação Lava Jato.

Com a posse de Bolsonaro, o Coaf passou a integrar a estrutura do Ministério da Justiça e Segurança Pública, seguindo a estratégia de concentrar os poderes de combate à criminalidade nas mãos do ministro Sérgio Moro. No entanto, numa das primeiras derrotas de Bolsonaro no Congresso, o dispositivo foi derrubado e o Coaf teve que voltar à esfera do Ministério da Economia.

(Brasília – DF, 04/04/2019) Presidente da República, Jair Bolsonaro durante audiência com Sergio Moro, Ministro de Estado da Justiça e Segurança.rFoto: Marcos Corrêa/PR

 

Ao longo das últimas semanas, o Coaf e diversos órgãos de controle como a Receita Federal e a Polícia Federal vêm sendo alvo de críticas do presidente da República, e a edição da Medida Provisória transformando o Coaf em Unidade de Inteligência Financeira (UIF) do Banco Central é mais um capítulo desse processo.

Na prática, as competências legais do Coaf foram mantidas no novo órgão, assim como todos os atuais servidores serão remanejados para a UIF. No entanto, há diversas mudanças nas suas estruturas de governança que podem levar a um enfraquecimento da instituição.

Na cúpula do novo órgão, além do presidente, foi criado um Conselho Deliberativo, composto por 8 a 14 membros, que atuarão de forma não remunerada, designados pelo Presidente do Bacen. O número exato de conselheiros será definido pela Diretoria do Bacen.

Esse Conselho Deliberativo definirá as orientações e as estratégias de atuação da UIF, bem como julgará os processos administrativos com sanções aplicadas pelo órgão. Os conselheiros não precisam ser servidores de carreira, basta “reputação ilibada e conhecimentos reconhecidos na área”.

Nesse ponto reside uma importante alteração, uma vez que no antigo Coaf o Plenário era composto apenas por servidores indicados pelos órgãos reguladores do sistema financeiro no Brasil (Bacen, CVM, Susep, Previc), por agências de controle (CGU, Polícia Federal, Abin, PGFN e Receita Federal) e pelos ministérios que tratam da segurança e da cooperação internacional (MRE e MJ).

Ainda no campo da composição do novo órgão. a medida provisória admite em seu quadro técnico-administrativo militares, servidores e empregados cedidos de outros órgãos e ocupantes de cargos comissionados (não concursados). No antigo Coaf só entravam servidores de carreira.

A presença de militares, servidores cedidos e comissionados sem vínculo com a Administração Pública no âmbito da UIF será um fato incomum, pois o Banco Central, instituição à qual estará vinculada administrativamente, só admite servidores de sua própria carreira nos níveis abaixo da Diretoria Colegiada. A justificativa do governo, entretanto, é que a MP assegura autonomia técnica e operacional à UIF.

Outra mudança importante é que o processo administrativo pelo qual a UIF poderá aplicar sanções a agentes deixa de ser regulado por decreto (atualmente a matéria é tratada pelo Decreto nº 9.663/2019, assinado por Moro) e passará a ser definido pela Diretoria Colegiada do Banco Central, que também será responsável por aprovar o regimento interno do novo órgão.

É bom lembrar que as novas regras, apesar de já estarem em vigor, ainda dependem do Congresso Nacional, que tem o prazo de 60 dias (prorrogável por mais 60 dias) para aprová-la, alterá-la ou simplesmente rejeitá-la.

Durante esse prazo, o governo precisa explicar ao Congresso e a toda a sociedade quais benefícios essas mudanças trarão para o combate à corrupção e à lavagem de dinheiro no Brasil.