Por Bruno Carazza.

 

O governo publicou hoje, 02/04/2020, a Medida Provisória nº 936, que estabelece novas medidas trabalhistas para enfrentarmos a crise econômica da Covid-19.

Para diminuir os impactos sociais e econômicos da crise, o governo atacará em 3 frentes:

1) o pagamento de um Benefício Emergencial;

2) autorização para redução proporcional de jornada de trabalho E salário; e

3) possibilidade de suspensão temporária do contrato de trabalho

 

O Benefício Emergencial será pago pelo governo federal quando as empresas reduzirem a jornada (e os salários) ou suspenderem os contratos de trabalho de seus empregados. O benefício será mensal e começará a ser pago no prazo de 30 dias a partir da celebração do acordo entre patrões e empregados. O empregador terá o prazo de 10 dias para avisar ao Ministério da Economia, por meio de sistema a ser desenvolvido.

 

E qual será o valor do benefício?

a) No caso de redução de jornada, o governo pagará o valor do seguro-desemprego multiplicado pelo % da redução (ou seja, se a redução da jornada for de 50%, o valor do benefício será de 50% do seguro-desemprego devido);

b) No caso de suspensão temporária do contrato de trabalho, o benefício será de 100% do seguro desemprego (regra geral) ou de 70% do seguro-desemprego se for empresa com receio bruta superior a R$ 4,8 milhões (pois essas grandes empresas entrarão com os outros 30%).

Não farão jus ao benefício: servidores públicos de qualquer natureza, beneficiários de BPC (benefício de prestação continuada), de regimes próprios de previdência, de seguro-desemprego e de bolsa de qualificação profissional. Pessoas com mais de um vínculo empregatício poderão receber mais de um benefício, mas há um limite de R$ 600 para aqueles que possuem contrato por trabalho intermitente.

 

E quais são as condições do acordo de redução de jornada e salário?

i) manutenção do valor do salário-hora;

ii) os percentuais da redução poderão ser de 25%, 50% ou 70%;

iii) validade por no máximo 90 dias, podendo ser encerrado antes.

 

No caso de suspensão do contrato de trabalho, valem as seguintes regras:

i) prazo máximo de 60 dias, podendo ser fracionado em 2 períodos de 30 dias;

ii) nesse período o empregado continuará fazendo jus aos benefícios concedidos pelo empregador (plano de saúde, por ex);

iii) descaracteriza a suspensão do contrato qq atividade de home-office feita a pedido do empregador; e

iv) a suspensão poderá ser encerrada a qq momento por acordo entre as partes.

 

Tanto no caso da redução de jornada ou da suspensão do contrato de trabalho, a empresa poderá pactuar o pagamento de uma ajuda compensatória mensal ao empregado, além do benefício emergencial provido pelo governo. Essa ajuda mensal não será computada para fins de FGTS, contribuição previdenciária, imposto de renda e será abatida do IRPJ e da CSLL das empresas.

 

A MP ainda garante o emprego de quem tiver sua jornada reduzida ou o contrato de trabalho suspenso pelo dobro do tempo da restrição, com o aumento das indenizações devidas em caso de demissão sem justa causa nesse período de proteção.

 

Os acordos poderão ser celebrados por negociação coletiva, inclusive pactuando percentuais diferentes de redução da jornada (nesse caso, o benefício governamental será ajustado mediante faixas de valores). A negociação coletiva é obrigatória para quem ganha acima de R$ 3.135 ou, portador de diploma de curso superior, recebe salário superior ao dobro do teto do INSS.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, durante coletiva sobre ações do governo para combate ao Covid-19. FOTO: Edu Andrade/Ascom/ME

Com essa medida, o governo implementa a sua estratégia de repartição de danos entre empregadores, empregados e a própria União. Como a relação de poder é muito desigual entre as partes, os prejuízos também poderão ser muito diferentes entre esses três grupos. É difícil prever como será a dinâmica da perda de renda mensal entre os setores econômicos e o custo final da fatura para o governo.

Mas há um indicativo.

Note que o benefício a ser distribuído pelo governo é calculado com base no valor do seguro-desemprego, e não do salário efetivo do empregado. Isso representa uma perda significativa para os trabalhadores, conforme pode ser visto nesta simulação:

O rendimento médio do trabalhador brasileiro é de R$ 2.213. Segundo as regras atuais de cálculo, o valor do seguro-desemprego é de no máximo R$ 1.385,90.

Situação 1: Redução de 25% da jornada.

De acordo com a MP, seu salário passará a ser de R$ 1.659,75 (25% menos).

Mas ele fará jus ao benefício emergencial do governo, que será de R$ 346,48 (25% do seguro-desemprego).

Rendimento final: R$ 2.006,23 (prejuízo de 9,3%).

Situação 2: Redução de 50% da jornada.

O salário passará a ser de R$ 1.106,50 (50% menos).

Benefício emergencial do governo: R$ 692,95 (50% do seguro-desemprego).

Rendimento final: R$ 1.799,45 (prejuízo de 18,7%).

Situação 3: Redução de 70% da jornada.

O salário passará a ser de R$ 663,90 (70% menos).

Benefício emergencial do governo: R$ 970,13 (70% do seguro-desemprego).

Rendimento final: R$ 1.634,03 (prejuízo de 26,2%).

Situação 4: Suspensão do contrato de trabalho.

O salário passará a ser de R$ 0.

Benefício emergencial do governo: R$ 1.385,90 (100% do seguro-desemprego).

Rendimento final: R$ 1.385,90 (prejuízo de 37,4%).

 

Vale lembrar que essa é a simulação mais benefíca, pois o cálculo do seguro-desemprego tem uma série de condicionantes quanto à duração do contrato, a média salarial dos últimos 3 meses, períodos de carência em relação a pedidos anteriores, o recebimento de outros benefícios, etc. Certamente os especialistas em mercado de trabalho e legislação trabalhista terão muito melhores condições de avaliar, em breve, o saldo de perdas e ganhos de trabalhadores, governo e empresas derivadas da MP 936.

 

Por fim, é bom lembrar que servidores públicos da União, Estados e municípios, bem como a classe política em geral, ainda não deram sua contribuição nessa partilha de prejuízos gerados pela pandemia.

 

Segue a íntegra da MP nº 936/2020:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Mpv/mpv936.htm

 

 


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