Saiu no site da Câmara dos Deputados hoje uma interessante notícia sobre a insatisfação de alguns deputados sobre a predominância, na pauta de votações daquela Casa legislativa, de projetos de lei encaminhados pelo Poder Executivo.

De acordo com a matéria (disponível em http://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/POLITICA/194266-DEPUTADOS-QUEREM-MAIS-PROPOSTAS-DO-LEGISLATIVO-EM-VOTACOES-NA-CAMARA.html), quase 80% das 3.854 leis aprovadas entre 1988 e 2007 foram propostas pelo Poder Executivo (3.071), contra apenas 16,7% de autoria de deputados e senadores (644) e 3,6% do Poder Judiciário (3,6%).

Esses números têm como fonte o trabalho do professor de Ciência Política da USP José Álvaro Moisés, intitulado “O desempenho do Congresso Nacional no presidencialismo de coalizão” (encontrei uma versão preliminar do trabalho em http://www.usp.br/nupps/seminarios/qua_mesa1.pdf).

O que é importante frisar nessa análise é que, a princípio, não constitui nenhuma irregularidade o fato de que o Presidente da República propõe muitos projetos de lei para análise do Congresso Nacional.

De acordo com o art. 61, caput, da Constituição Federal, as leis podem ser propostas no Brasil pelos seguintes agentes ou entidades:
i) Qualquer Deputado ou Senador;
ii) Presidente da República;
iii) Comissões da Câmara, Senado ou do Congresso Nacional;
iv) Supremo Tribunal Federal;
v) Tribunais Superiores (STJ, TSE, TST e STM);
vi) Procurador-Geral da República (chefe do Ministério Público da União) e 
vii) Cidadãos (projeto de lei subscrito por pelo menos 1% dos eleitores do país, distribuídos por 5 Estados e com pelo menos 0,3% dos eleitores de cada Estado). 

É interessante notar, que a própria Constituição Federal estabelece a um ou outro agente a exclusividade para propor leis sobre determinadas matérias. No caso do Presidente da República, a Constituição reserva para ele a prerrogativa de propor projetos de lei sobre os seguintes assuntos (art. 61 , §1º):

Art. 61…

 

§ 1º – São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

 

        I – fixem ou modifiquem os efetivos das Forças Armadas;
        II – disponham sobre:
        a) criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;
        b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;
        c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)

 

        d) organização do Ministério Público e da Defensoria Pública da União, bem como normas gerais para a organização do Ministério Público e da Defensoria Pública dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;

 

        e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI;  (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 32, de 2001)
        f) militares das Forças Armadas, seu regime jurídico, provimento de cargos, promoções, estabilidade, remuneração, reforma e transferência para a reserva. (Incluída pela Emenda Constitucional nº 18, de 1998)
 
A Constituição Federal também reserva para o Presidente da República a competência para editar as famigeradas medidas provisórias, que já foram comentadas nesse blog.
A questão a ser colocada, portanto, não é se há um abuso do Poder Executivo na propositura de projetos de lei – uma vez que a Constituição determina que certos temas cabem exclusivamente a ele. A questão refere-se à maneira como o Poder Legislativo lida com sua atribuição mais nobre – a votação das leis.
(Continua…)