Há algo de muito estranho nos institutos de pesquisa nestas eleições. E isso não tem a ver com as estimativas de votos nos candidatos

Por Bruno Carazza

 

A 25 dias das eleições, o que dizem os dados do Tribunal Superior Eleitoral sobre as pesquisas eleitorais? Cresceu o interesse em saber o que se passa na cabeça do eleitor em relação a 2012 e 2016? Quais são os institutos de pesquisa que lideram esse mercado?

Os dados divulgados pelo TSE ainda estão incompletos, pois só metade dos Tribunais Regionais remeteu informações sobre as pesquisas registradas em seus Estados. Mesmo assim, já dá para comparar com os anos anteriores e extrair algumas tendências do mercado. Mais do que isso, os dados indicam que há algo de pobre no reino das pesquisas eleitorais realizadas Brasil afora.

Como pode ser visto no gráfico abaixo, computando apenas os Estados para os quais existem dados no site do TSE e corrigindo os efeitos da inflação, os gastos com pesquisas eleitorais em 2020 (R$ 22,7 milhões) estão bem abaixo do verificado em 2016 (R$ 28 milhões) e em 2012 (R$ 42 milhões) a esta altura da disputa. É bom lembrar que em 2012 ainda eram permitidas doações de empresas, e em 2016 não havia o fundão eleitoral – dois fatos importantes para se entender a dinâmica do mercado de levantamentos eleitorais no Brasil.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE. Valores de 2012 e 2016 deflacionados pelo IPCA.

Mas faturamento mais baixo não significa menor interesse nas eleições, pois o número de entrevistados neste ano está bem acima do observado em 2016 e quase igual ao verificado em 2012. Isso indica que o custo das pesquisas caiu, certamente em função de novas técnicas de amostragem e a adoção de novas tecnologias de aferição de intenção de voto.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

 

Quando desagregamos esses dados regionalmente, uma surpresa: o Estado onde mais se gastou até agora com pesquisas foi Rondônia, quase três vezes mais que São Paulo e cinco vezes mais que Minas Gerais. Esse dado é tão desproporcional que eu cheguei a acreditar que fosse um erro de digitação nos dados prestados ao TSE – tanto que eu não incluí os valores de Rondônia nos dois gráficos anteriores.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

 

Ao mergulhar mais a fundo no banco de dados do TSE, porém, algo muito mais suspeito emerge.

Sessão Jurisdicional do TSE por videoconferência (22/10/2020). Foto: Ascom/TSE
Sessão Jurisdicional do TSE por videoconferência (22/10/2020). Foto: Ascom/TSE

Pesquisando os institutos de pesquisa que mais faturaram em 2020, desponta o desconhecido IHPEC (Instituto Haverroth) – justamente quem realizou os levantamentos em Rondônia. Ele está bem à frente do Ibope, Publi. QC e Datafolha, que vêm em seguida. Bem estranho, não?

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

O que torna ainda mais esquisita essa história do Instituto Haverroth é que ele declara a si próprio como o contratante das suas pesquisas, e não uma rede de comunicação ou um partido político, como é o mais comum:

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do TSE.

A mesma tendência, porém, é identificada com outros institutos de pesquisa, como Publi. QC, Doxa, Real Time Big Data e outros. Em tempos de tamanha crise econômica, chama a atenção esse movimento de empresas de pesquisa que contratam pesquisas milionárias apenas para consumo próprio. O mais provável é que estejam simplesmente ocultando o cliente final de seus serviços.

Já faz tempo que o TSE e o Ministério Público precisam se preocupar não apenas com a obrigação de partidos, candidatos e institutos de pesquisas publicarem os dados na internet, mas também com a integridade dessas informações e com as suspeitas que emergem delas.

Como disse antes, esses dados podem estar sendo afetados por erros de digitação de valores. Mas é bom ficar de olho se algo mais grave não está ocorrendo no mercado de pesquisas eleitorais, como lavagem de dinheiro, fraudes eleitorais ou uso de laranjas.


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